Brasil e Canadá, cada vez mais próximos

Terceira edição do Encontro de Comércio Exterior da CCBC mostra que, mesmo com a pandemia, os dois países intensificaram o intercâmbio bilateral – e há potencial para uma relação ainda mais intensa nos próximos anos

Por Sérgio Siscaro

O relacionamento comercial entre Brasil e Canadá nos últimos anos mostra que há muito espaço para ampliar a parceria entre os dois países. Esta foi a principal constatação dos participantes da terceira edição do Encontro de Comércio Exterior promovido pela Câmara de Comércio Brasil-Canadá (CCBC), de forma virtual, em 6 de abril. O principal objetivo do evento foi discutir as formas pelas quais esse intercâmbio possa atingir todas as suas potencialidades – perspectiva que poderá se tornar mais concreta a partir da efetivação do acordo de livre comércio entre os países do Mercosul e o Canadá, que vem sendo negociado desde 2018.

Estas perspectivas se baseiam em dados que permitem projeções otimistas para o futuro. Em 2000, a soma das exportações e importações entre os dois países era de US$ (FOB) 1,656 bilhão; em 2020, este montante já atingia US$ (FOB) 6,041 bilhões. Apesar da pandemia da Covid-19 e seus impactos sobre a atividade econômica, as exportações brasileiras ao Canadá aumentaram 25,25% entre 2019 e 2020, atingindo US$ (FOB) 4,235 bilhões. Essa proximidade também se revela nos investimentos de empresas canadenses no Brasil – tanto as já estabelecidas no país quanto as recém-chegadas – em áreas tão diversificadas quanto construção civil, infraestrutura de transportes, saneamento, mineração, tecnologia e energia.

Estruturado de forma a tratar de forma específica os principais assuntos que cercam a relação bilateral entre Brasil e Canadá, o 3º Encontro de Comércio Exterior apresentou painéis temáticos, reunindo participantes que discutiram temas como tributação para exportação e política cambial, desafios para o comércio exterior brasileiro, relações entre Brasil e Canadá, tendências do comércio de serviços entre os dois países, e-commerce e transporte de cargas.

Além disso, o governo canadense foi representado pela embaixadora no Brasil, Jennifer May; pela conselheira comercial e econômica da embaixada, Bonny Berger; e pela cônsul-geral em São Paulo, Heather Cameron. Já o governo brasileiro teve três representantes no evento: do Ministério da Economia, participaram a secretária especial adjunta na Secretaria Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais (Secint), Yana Dumaresq Sobral Alves, e o secretário-executivo da Câmara de Comércio Exterior (Camex), Carlos Pio. Do Ministério das Relações Exteriores, o diretor do Departamento de Serviços e Indústria da Secretaria de Comércio Exterior e Assuntos Econômicos, Luiz Cesar Gasser. O encerramento do evento foi feito pelo presidente da CCBC, Paulo Perrotti.

Colaboração bilateral

Lembrando que em 2021 se comemoram os 80 anos do estabelecimento formal de relações diplomáticas entre os dois países, a embaixadora do Canadá no Brasil, Jennifer May, detalhou as diversas instâncias de colaboração – que incluem desde o Grupo de Ottawa, que estuda reformas na Organização Mundial do Comércio (OMC), até ações de combate a incêndios florestais e a assinatura de um memorando de entendimentos entre o governo canadense e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), entre outras iniciativas. Mas o destaque foi para o andamento das negociações do acordo de livre comércio entre os países que integram o Mercosul e o Canadá. “Já realizamos sete rodadas de negociações, que foram interrompidas no ano passado por conta da pandemia. Mas o trabalho continua; o acordo, moderno e ambicioso, continua sendo uma prioridade para o Canadá”, afirmou.

Com relação às oportunidades de expansão da cooperação econômica entre os dois países, a embaixadora se mostrou bastante otimista. Citando dados que comprovam o crescimento tanto da corrente de comércio quanto dos investimentos entre Brasil e Canadá, May avaliou que, mesmo com a pandemia do novo coronavírus, 2020 foi um ano positivo. “Há muitas oportunidades a serem exploradas.”

A conselheira Berger, também da embaixada canadense, salientou que a futura assinatura do acordo com o Mercosul está inserida na estratégia do Canadá em diversificar seus parceiros comerciais ao redor do mundo. “Consideramos as parcerias com outros países muito importantes. O Brasil, por exemplo, é um poucos países que participa do Canadian Internacional Innovation Program (Ciip)”, afirmou. A iniciativa mencionada apoia empresas canadenses que desenvolvam projetos em colaboração com parceiros do Brasil, China, Coreia do Sul, Índia e Israel.

Do lado brasileiro, esta avaliação foi compartilhada por Gasser, do Ministério das Relações Exteriores. “Nossa relação é fundamentada em valores e princípios convergentes.” Mencionando os números de investimentos dos dois países em 2020 – US$ 12 bilhões do Canadá para o Brasil, e US$ 15,4 bilhões do Brasil para o Canadá –, ele se mostrou otimista com relação à elevação desse intercâmbio. “A solidez desses fluxos de investimentos deve ser vista como um marco na relação bilateral”, disse. Ele acrescentou ainda as oportunidades que o governo federal está abrindo para investimentos em áreas diversas, como na concessão de projetos de infraestrutura.

Oportunidades pós-pandemia

Um estudo preparado pela CNI mostrou que a intercâmbio de serviços oferece um importante potencial de crescimento na relação bilateral nos próximos anos. Nesse sentido, o gerente de Negociações Internacionais da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Fabrizio Sardelli Panzini, pontuou que a maior parte (43,6%) das exportações brasileiras entre 2015 e 2019 se concentrou na prestação de serviços auxiliares de processamento de dados – que contabilizaram, nesse período, um montante de US$ 750,3 milhões. No sentido inverso, a locação de equipamentos de telecomunicações sem operador respondeu por 14,4% das exportações canadenses de serviços ao Brasil, representando US$ 171,6 milhões.

“Com a finalidade de elevar o nível de acesso ao mercado dos dois países, há seis propostas específicas no capítulo de comércio de serviços na proposta do acordo Mercosul-Canadá”, afirmou. Essas propostas envolvem a facilitação do trânsito de prestadores de serviços, limitação da exigência de presença local, redução de custos de fretes marítimos, equivalência de diplomas profissionais, abertura de mercado de telecomunicações (com redução dos custos de roaming para telefonia móvel) e facilitação dos processos de emissão de vistos de trabalho entre os dois países.

Também abordando este tema, o diretor Marcel Motta, da Euromonitor International, considerou a necessidade de mudança de consciência das empresas brasileiras – que ainda estariam excessivamente presas às potencialidades do mercado doméstico, e alheias às oportunidades do mercado externo. “Consideramos os mercados do Brasil e do Canadá como um só para destacar as oportunidades que eles oferecem para companhias dos dois países”, afirmou. “Se considerarmos o setor de alimentos industrializados dos dois países em 2020, por exemplo, temos no Brasil um mercado de US$ 82 bilhões, e no Canadá, um de US$ 50 bilhões. Ou seja, juntos representam um mercado de US$ 132 bilhões – o que o tornaria o quarto maior do mundo, atrás apenas de Estados Unidos, China e Japão”, avaliou. Para Motta, é importante ter em mente também o alto poder aquisitivo dos consumidores canadenses, e sua capacidade de consumir produtos mais caros.

Temas pertinentes

Vale destacar ainda as discussões sobre a logística de transportes entre os dois países, que contou com a participação do gerente de operações de carga da Air Canada, Marcelo de Lina; da gerente de desenvolvimento de cargas do porto canadense de Saint John, Shannon Blanchard; e do diretor-gerente da Mellohawk Logistics, Arnon Melo. Na ocasião, foram levantadas questões como a redução de vôos de carga entre o Brasil e o Canadá por conta da pandemia, as possibilidades abertas a exportadores brasileiros pelo porto de Saint John e as oportunidades para redução de custos logísticos.

Já os aspectos tributários do comércio exterior foram debatidos pela advogada Cora Mendes, do escritório Pinheiro Neto Advogados; pelo sócio-diretor da área de Trade & Customs da consultoria KPMG, Daniel Maia; e pelo assessor técnico especialista da Diretoria de Economia, Regulação Prudencial e Riscos da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Marcelo Ferreira Lima. O crescimento do comércio eletrônico durante a pandemia e suas perspectivas futuras foram analisadas pelo presidente da ABComm, Maurício Salvador.